segunda-feira, setembro 29, 2008

temporariamente perdido

Sou um feixe de luz branca que atravessa o negro universo, sempre em linha recta. Neste momento bati num prisma e fui dividido nas várias cores do arco-íris. É difícil pensar assim, quando nos sentimos dispersos, inebriados com a beleza da sinfonia de cores, mesmo que estas não sejam a nossa cor. É difícil pensar assim, quando nos sentimos fragmentados no pensamento, quando este se divide em razão, emoção e sei lá quantas mais parcelas são.

Necessito tornar-me uno de novo e esse, é o caminho que estou agora a percorrer. Necessito orientar as cores e uni-las de novo em branco para continuar a travessia do belo e negro universo. Na verdade não sei se sou a luz, o universo ou ambos, mas as cores sei que não sou.

As cores são o comprazimento infantil, são o engano que nos turva a mente. Envolvem-nos na felicidade que nos impede de virar as costas e sair da caverna. Não nos deixa ver em pleno a luz, mas apenas as suas refracções.

As cores são Sísifo em pleno labor. Não nos levam a lugar nenhum. Não nos deixam seguir uma única direcção. Dão-nos várias opções que nos encantam. Perdemos toda a determinação e ficamos perdidos num mar de hipóteses sem escolha, que nos podem levar à loucura.

salad days IV

Um dia perguntaram-me se já tinha roubado alguma coisa. Fiquei calado por uns instantes e finalmente respondi: - Não sei,... não me lembro,... mas com certeza que sim.

Fui para casa com essa dúvida na mente. Como me ia encontrar de novo com a pessoa que colocou a questão, decidi nessa noite roubar um copo num bar. Depois do sucesso do acto, como se tivesse ligado um interruptor e se acendesse uma luz, lembrei-me que, durante a minha adolescência, de facto já tinha roubado algumas coisas sem expressão. Dessas, aquelas de que mais memória tenho são:
- flores, que juntamente com os meus amigos de infância roubávamos para depois as vendermos. Com o dinheiro comprávamos gelados.
- espigas de milho que, de novo com os meus amigos, assávamos e comíamos.

Coisa curiosa de que me lembro, era de não ter jeito nenhum para roubar e, por essa razão, os meus amigos punham-me sempre de vigia, quando o acto assim o exigia.

Encontrei-me de novo com a pessoa que tinha colocado a questão e disse-lhe que tinha roubado um copo que me fez lembrar outras coisas anteriormente roubadas.

Porquê o lapso de memória. Penso estar justificado no facto de ser um acto praticado tão despreocupadamente, tão cândido,… era como se a ele tivéssemos direito.

Nunca mais comi milho tão saboroso.

domingo, setembro 28, 2008

AA disse-me:

AA disse-me:

“as pessoas para quem temos menos paciência,
as pessoas para quem temos menos tolerância,
as pessoas a quem acabamos por magoar,
são aquelas que mais amamos.”

Porquê?, perguntei eu!

“Porque são aquelas perante as quais colocamos as nossas fraquezas a nu,
são aquelas com quem nos sentimos mais à vontade, mais em segurança,
são aquelas de quem esperamos sempre a infinita compreensão.

O melhor é explicar-lhes sempre o porquê das nossas atitudes.”

televisão

Vejo muito pouca televisão, muito pouca mesmo, resumindo-se praticamente às notícias da manhã, enquanto tomo o pequeno-almoço. Mas esta semana liguei a televisão enquanto jantava. Estava a dar um episódio da anatomia de Grey. Nunca tinha visto, embora já tivesse ouvido falar sobre a série. O episódio era uma espécie de resumo de todo o enredo da série, apresentado por um dos personagens e de uma forma temática. Uma das coisas que me chamou a atenção foi a referência à banda sonora. Aqui está o excerto dessa parte do episódio. Tenho pena de não saber qual era o episódio para aqui deixar o registo.

hoje fui ao teatro com I…

Hoje fui ao teatro com I… antes de entrar e ainda na rua, por causa da lei do tabaco, fomos abordados por um auto-intitulado guna.

Dizia ele que tinha chapéu porque era guna. Não duvidamos e começamos mesmo a suspeitar que o indivíduo, ligeiramente embriagado, poderia explodir a qualquer momento para uma situação por nós indesejada. Mas não!

Ele, entre as confissões da sua frustração numa situação passada com um casal de amigos do coração, recém-casados, pedia insistentemente para passarmos, depois do espectáculo, pelo café onde ele estava com os amigos, a meia dúzia de metros ao lado do teatro. Dizia que desejava ir ao teatro, mas queria saber se a peça valia a pena. I perguntava-lhe porque não ia ver a peça e ele dizia que queria saber se a peça era fixe. Dissemos-lhe que como ainda não tínhamos visto, ainda não lhe podíamos dizer nada. Ele pediu para lhe dizermos no fim, mas também dizia que já tinha perguntado a outras pessoas e todas lhe disseram que a peça não prestava.

Quando a peça acabou, saímos e vimos o Cândido, lembro-me agora de ele ter dito o seu nome, com os amigos. Pareceu-me ainda mais embriagado que anteriormente. Decidimos que o melhor era não ir ter com ele e seguimos o nosso caminho no sentido contrário.

Bom Cândido, “mentiram-te”. A peça era muito boa.

A peça é “Persona”, de Ingmar Bergman apresentada por “as boas raparigas…”, no “Estúdio 0” (mais informações em http://estudio0.blogspot.com/).
Aconselho a ver. Está em cena até ao próximo dia 2 de Novembro.

Gostei da representação das actrizes e das soluções de encenação. Achei que uma ou outra passagem de som, não estava lá muito bem conseguida, mas nada que comprometesse a peça. As luzes, não sendo o melhor da encenação, tinham momentos muito bons. A cena final e a confissão da enfermeira, foram para mim os momentos mais marcantes, cheios de força e muito bem representados.

Já os momentos menos conseguidos, foram as cenas iniciais, onde as personagens ficavam imóveis, o que me pareceu demasiado artificial, sobretudo a enfermeira pois a outra personagem era a enferma que se encontrava na cama. Ainda bem que tal situação só aconteceu uma ou duas vezes.

sábado, setembro 20, 2008

ai!

Ai!

Vi-te e como eu desejava que sentisses o mesmo que eu. Nem sei se tal possibilidade pode existir, mas o simples facto de achar que uma declaração minha te pudesse ofender e afastar-te ainda mais do que as raras vezes que nos vê-mos…

AA disse-me que se tu te ofendesses então não valias o esforço, mas: primeiro, tenho que arranjar desculpas para me acobardar; segundo, não vejo mal em que te manifestasses pelo desagrado, pois penso que todos nós temos o direito de manifestarmos os nossos sentimentos (isto é um contra-senso, não é?).

Conheço-te mal, mas uma mulher bonita e inteligente, é sempre atraente. Cativaste-me, não pela beleza física que tens, mas pela tua inteligência e forte carácter. É verdade que conheço e me rodeiam outras mulheres atraentes como tu, mas foste tu e o meu pensamento em ti, que fechou a última ferida com que fui brindado. Podem até dizer que me abriste uma nova ferida, mas esta só jorra felicidade. Prefiro pensar que vivo, neste momento, inebriado e que este sentimento se dissolverá com o tempo, no entanto, já algo deixou. Uma ferida fechada. Só por isso vale a pena a minha embriaguês em sentimentos não recíprocos.

Bom, duvido (mas tenho a secreta esperança) que algum dia descubras quem és, mas se tal acontecer gostava que te manifestasses. Isto soa-me um pouco ridículo, mas que se dane. Soa-me também a cobardia, mas de novo que se dane. E quem disse, que algum dia lerás este texto?

Porto bibo – sociedade de elitização urbana

Antes de começar a escrever esta minha opinião, resolvi ir ao site do "porto vivo" procurar apartamentos. Como não obtinha resultados, fui reduzindo as especificações até não colocar qualquer preferência. Desta forma obtive 3 resultados, todos eles referentes à venda de prédios com notas de se encontrarem em mau estado de conservação.

Depois desta busca, vou passar ao motivo que me leva a escrever estas linhas.

Fui informar-me sobre a venda dos apartamentos da Praça de Carlos Alberto, mais propriamente sobre os apartamentos do "Pátio Luso" que abarca, creio que 3 edifícios, sendo um, o do conhecido café Luso e outro, o da sede de campanha do general Humberto Delgado.

Apartamentos bem desenhados, sem preocupações em aproveitar todos os espaços, mas com a preocupação de um bom desenho. Preços absurdamente inflacionados a que o meu parco salário não chega para pedir empréstimo. Queixo-me a R dizendo que não se pode ter bom gosto. R responde que poder pode-se, mas não mais do que isso. -Vê lá, diz-me R, não cries uma obsessão. Não, não crio uma obsessão, mas que vou jogar no euromilhões e nem costumo… ai lá isso vou!

No fim-de-semana passado, converso com um jovem arquitecto e fico chocado com o seu discurso. Diz-me que a cidade do Porto é para os turistas e não para as pessoas que a habitam. Estas só sabem sujar a cidade e estragar. Deveriam, a começar pelos mais velhos, de ser realojados nos subúrbios da cidade. Diz ainda da população,
que são todos uns vândalos e como tal devem ser tratados. Pergunto-lhe se me considera um vândalo. Diz-me que não, mas que só quem tem dinheiro é que deve morar no centro da cidade ou seja: quem tem dinheiro para pagar uma casa inflacionada, compra, quem não tem, tal como ele próprio se descreveu, não compra e vai morar para fora da cidade. Sinto pena dele, tão novo e já com ideias tão curtas e empedernidas. Falei-lhe em educar as pessoas e ele riu-se na minha cara. De referir que momentos antes tínhamos passado pela rua da Banharia, onde uma senhora, muito simpática, com 81 anos de idade, nos abriu as portas (a um grupo de cerca de 30 pessoas que calcorreava as ruas históricas do Porto) para a visita ao pátio de acesso às habitações reabilitadas que os “velhos” moradores adquiriram e que com muito amor e dedicação mantinham asseado. Todos nós ficámos extasiados com a beleza e o aprumo do pátio, enquanto a senhora, com orgulho, ia respondendo às questões que lhe colocávamos. E ele risse na minha cara, quando lhe falo em educar as pessoas? Pobre rapaz!

domingo, setembro 14, 2008

confiança

AA disse-me: "Falar falo com todos, mas confiar, só em alguns".

salad days III

Olho para os raios de sol que entram por entre as frestas da janela e sou levado para os meus dias felizes da infância.

Ficava esquecido, a observar no tempo pequenas partículas de pó. Elas subiam pelos raios de sol até atingirem a sombra. Agarrava-me, então, a uma nova partícula de pó e repetia a viagem.

Oh! Que felicidade quando me libertavam da sesta um minuto mais cedo para ir brincar.

E a bola, que não era de trapos, mas era de plástico. Tão leve, tão leve, que quando chutada com força, fazia trajectórias alucinantes e diminuía de velocidade de uma forma desesperadamente abrupta. Não duravam muito tempo, essas bolas, e sempre que alguém conseguia arranjar algumas moedas, íamos felizes ao “bazar dos três vinténs” ou à “casa dos plásticos”.

Adorava trepar muros e andar pelos telhados. Naquela altura julgava ser uma brincadeira normal, estes ares de acrobata, mas hoje penso serem privilégios de uma infância, por muitos, desejada.