sexta-feira, agosto 29, 2008

recordo! (ou o elogio do preto)

Recordo!

Recordo-me de ser adolescente e ser conhecido na zona onde morava como “aquele que anda de preto”. Esta sentença era anunciada em voz baixa, com algum mistério e temor místico. Era como se eu fosse uma espécie de mau agoiro.

Já ouvi vezes sem conta a pergunta: “Porque é que andas sempre de preto?”
Porque gosto, é a resposta. É claro que é pouco para satisfazer as pessoas, mas é a verdade. Gostariam, talvez, de me ouvir dizer que pertenço a uma tribo qualquer cuja “imagem de marca” é o preto.

Na verdade, acabo por me confundir com algumas dessas tribos e até imiscuir-me no meio delas fazendo amizades que perduram, mas nunca me quis conotar com nenhuma delas. Esta ligação acontece porque dentro destas tribos tenho encontrado das pessoas mais cultas, inteligentes e despretensiosas que conheço. É claro que não são todos assim e muitos são mesmo o oposto, mas em termos percentuais empíricos, são os meios onde encontro mais gente interessante.

Mas porque não adopto eu uma destas tribos?

Gosto imenso de pensar pela minha cabeça e ir seleccionando aquilo que me interessa sem ter que me agarrar à ditadura de um grupo. Já me chamaram de anarco-sindicalista e, talvez considerando (por falta de um profundo conhecimento da matéria) um pouco exagerado o epíteto, a palavra anarco agrada-me. Livre-pensador, outro epíteto que me colaram, soa-me melhor. Talvez por não trazer com ele uma carga tão pesada de interpretações.

Para além das pessoas interessantes que encontro nestas tribos, é a cor preta que me atrai. Também a contradição me atrai. Pensar que os “heróis” não têm que aparecer sempre de “branco”. Pensar que os “heróis” podem aparecer de preto.

Recordo-me que, por andar sempre de preto, um dia me classificaram como positive punk, classificação que não adoptei e facto curioso, os próprios ditos criadores do movimento também rejeitaram. Bom, já me classificaram como gótico ou metaleiro, mas, como sempre, rejeitei. Sim, gosto de siouxsie and banshees, bauhaus, napalm death… e depois? Também gosto de björk, radiohead, squarepusher… de pogues, negativland, harry connick jr… de adriano correia de oliveira, mão morta, mariza… de john zorn, nine inch nails, negativland… bom, podia ficar aqui a preencher linhas com nomes de bandas e músicos, mas o que interessa, para além de aqui divulgar alguns dos nomes que me agradam (e não são só os que mais me agradam), é dizer que me enriquece o facto de ter os meus horizontes tão alargados.

Um dia um professor, artista reconhecido, disse-nos que a cor que um pintor mais gasta é o branco. Pois, professor, mas no meu caso é o preto.

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