quinta-feira, outubro 30, 2008

o Ardina

Quarta-feira, 18.30 h. O comboio chega à estação de S.Bento.

Saio da estação e dirijo-me para a praça da Liberdade. Com a mudança da hora para o horário de Inverno, já é noite.

Quando estou a aproximar-me do Ardina (estátua que se encontra na dita praça), noto um casal de turistas a observar curiosamente o Ardina, a aproximarem-se cuidadosamente e com alguma desconfiança. Estranhei, mas logo compreendi.

Ele aproximou, lenta e cuidadosamente a sua mão, à mão do Ardina que segura o jornal. Tocou-lhe ao de leve para logo de seguida e desfeito o mistério, dar-lhe duas ou três sapatadas fortes na mão, para confirmar à sua companheira que se tratava de uma estátua verdadeira e não de um homem estátua.

Hoje, quinta-feira, ao dirigir-me para a estação, notei um grupo de vários indivíduos em volta do Ardina. Pareceu-me que riscavam qualquer coisa no jornal que pende da sua mão. E estavam mesmo. Estavam com folhas de jornal a riscar por cima do jornal de bronze, de forma a decalcar a textura do segundo para o primeiro. Achei de novo curiosa esta interacção com o Ardina.

É maravilhoso notar como uma estátua, pela qual passo todos os dias, para a qual olho todos os dias e pela qual muitas vezes lamento os actos de vandalismo* a que se vê sujeita, consegue, mesmo assim, atrair das mais diversificadas formas a curiosidade dos transeuntes.


* Lamento terem-lhe partido a ponta do cigarro que lhe pendia nos lábios. Lamento as “spraysadas” de que foi vítima e que são notórias no jornal. Lamento a falta de cuidado da autarquia que não zela convenientemente pelos monumentos que possui (mas o desrespeito da câmara municipal pela cultura da cidade, é outra história que tem pano para mangas).

terça-feira, outubro 28, 2008

negativland

01/10





02/10





03/10





04/10





05/10





06/10





07/10





08/10





09/10





10/10





Não resisto a colocar mais estes dois.

Time Zones





Car Bomb




segunda-feira, outubro 27, 2008

porque escrevo?

Escrevo porque não quero dizer a razão de escrever, escrevo porque as palavras me afluem aos dedos, escrevo porque não tenho razão para o fazer.

Escrevo porque não existe sentimento, escrevo porque é o que acontece, escrevo porque não é isso que penso.

Escrevo porque não existe o que escrevo, escrevo porque me lembro e escrevo, escrevo porque não sei o que escrevo.

Escrevo, escrevo, escrevo e afinal não escrevo, apenas deixo os meus dedos passearem sobre o teclado e lutarem com as palavras para se formarem frases sem sentido que apenas dizem o que não dizem.

São enganos, são metáforas, são pregos na calçada onde caminho descalço.

São alucinações, são pesadelos, são gomas que me colam o peito ao céu.

São verdades, são vocábulos, são sentenças que perdi a jogar com o vento.

É a queda dos dedos sobre o tecladopof kgjq0020+psaldpf bvuqbwfjnwqfb

domingo, outubro 26, 2008

palavras nas mãos

Adormeço com as tuas palavras nas mãos e sonho com todas as vezes que pensei em ti.

eu era para ser dois

Eu era para ser dois, mas acabei por ser vários num só.

Quando parti para a nascença estava decidido que iria ser dois, mas as coisas nem sempre correm conforme o planeamento do destino. Ser dois significava perder um de nós. Por outro lado, ser um para dois era mais enriquecedor. O que não sabíamos era que ao tomarmos a decisão de ser dois num só, estávamos a abrir o caminho para nos tornarmos vários num só.

Este facto de ser vários, ajuda-me a entender melhor os…

Os meus dedos congelaram e os meus olhos, mortos de cansaço, baniram-se da minha face. Parei e o mundo inteiro parou. Ficámos todos na expectativa. Para que mundos tinha eu agora viajado? É uma resposta difícil de dar, mas entre dor e prazer, detive-me. O melhor caminho, é aquele que nos deixa vislumbrar ambas as opções para, entre elas, construirmos o nosso próprio carreiro. Cruzamos com a formiga que segue em sentido contrário e percebemos que foi enganada. Não é o sentido contrário que ela deve tomar, mas sim criar e seguir um novo carreiro, o seu carreiro.

Pouso os meus dedos um a um sobre o veludo negro da caixa, fecho-a e guardo-a. Deixo o texto repousar e vou para junto dos meus olhos. Felizes, reencontramo-nos e partimos unidos para um merecido descanso.

sexta-feira, outubro 24, 2008

nada

Estou na beira da janela, junto ao tecto e observo os pés das pessoas que passam na rua. Na verdade, não consigo ver outra coisa da janela senão os pés das pessoas que passam. Agarro-me às grades que me separam da rua e imagino como será caminhar em liberdade. E lá fora, as pessoas continuam a caminhar.

Vejo-me a cair num poço branco sem fim e fico feliz por não ter fundo. Será, por assim dizer, uma queda para toda a eternidade ou por outras palavras, o caminho para a imortalidade. Não são todos os que concorrem para a perenidade e apenas alguns encontrarão o caminho. No meu caso, o caminho é um poço cheio de luz branca e sem fundo.

Olho em volta e o que vejo? Nada!

Nada é um excelente ponto de partida e a minha felicidade aumenta. Tenho todo o espaço do mundo sem nada. Tenho todo o espaço do mundo para construir. Construir a partir do nada não é fácil, requer apenas muita imaginação. Tento partilhar este espaço com quem se aproxima, mas todos me acham sonhador, ingénuo e absurdo. Falta-lhes imaginação para conseguirem conceber algo a partir do imenso nada.

Uma tela branca está cheia de luz. É preciso, primeiro, reduzi-la a nada e isso significa retirar-lhe toda a luz. Reduzi-la ao negro e a todas as possibilidades que o mesmo nos dá. Só depois temos ponto de partida.

Porque vestes de preto? – perguntam-me. Porque sou o ponto de partida, respondo eu. Não quero ser julgado pelo que visto, mas é por aí que acabo por ser condenado. Falta de imaginação das pessoas, que não conseguem pensar para além do estereotipado. Deviam partir de mim e não do que trago vestido. Mas compreendo, … é mais fácil!

Alguém repara que tenho um buraco negro na orelha e que ele suga tudo que dele se aproxima. Não tenho culpa, mas agora compreendo porque é que existe nada.

sábado, outubro 18, 2008

vidas

Subia Passos Manuel, em direcção ao San Martino, quando ao passar à porta do Coliseu, reparo numa jovem estudante de capa e batina. Reconheci aquele rosto, não porque fosse de alguém que eu conhecesse, mas por ser um rosto reconhecível.

No início do novo milénio, costumava apanhar um autocarro que passava junto à escola do Cerco. Também essa jovem costumava apanhar esse autocarro para se dirigir para a respectiva escola. Era fácil de reconhecê-la já que tinha um problema físico não incapacitante, mas que a tornava distinguível entre os outros jovens estudantes. Deixei de apanhar esse autocarro, mas de tempos em tempos lá ia vendo a jovem em determinados pontos da cidade.

Ontem ao vê-la ocorreu-me um pensamento. Esta jovem chegou a um ponto particular da sua vida, vida que eu fui acompanhando através dos cruzamentos casuais do nosso dia a dia.

Noite.

Na rua, à porta do 77, reencontro J “Super Bock”. É um amigo de longa data que já não via há bastante tempo. Converso com ele, T e Z, entre o ruído de conversas alheias, copos e garrafas espalhadas pelo passeio e cheiros ilícitos.

A noite avança serena e quando dou por isso, estou no Armazém do Chá. Já só restamos dois. Eu e J SB. Enquanto conversamos, não paramos de cumprimentar pessoas que vão aparecendo e que, ou a mim ou a ele ou sobretudo a ambos, vão reconhecendo. Eis que uma dessas pessoas que eu não conhecia, o E, cumprimenta o J SB e ao cumprimentar-me a mim diz:
- Eu conheço-te! Tu eras o vocalista dos B.
- Sim, digo eu.
- Sabes, diz-me ele, de certa forma eu tenho acompanhado a tua vida desde então.
- Ai é! Como assim?
- De vista! Vou te vendo aqui e ali. Posso dizer, no fundo, que tenho acompanhado a tua vida de vista.

Sim, E tinha razão. E eu lembrei-me de novo da jovem estudante a quem eu tenho acompanhado a vida, de vista, desde a sua adolescência até à idade adulta.

terça-feira, outubro 14, 2008

hoje ainda estou a escrever como pinto.



Hoje ainda estou a escrever como pinto. Procuro impossibilidades como, o infinito, o acaso, o vazio… informalismo, mas o que é o informalismo? O informalismo não é a procura. O informalismo é a vontade de fazer, sem intenção de comunicar, é alienação, é sem assunto, é vómito, é automatismo instintivo, é fruição descontrolada de uma produção alheia e desgovernada, é obra aberta. É isso que produzo. E hoje escrevo como pinto. Não quero nada mais, apenas produzir. Observar linhas de palavras, com mais ou menos sentido, desfilarem pelo monitor como se fossem atrasadas para o chá.

Não me parece difícil escrever algo inteligível, mas sem preocupação de significar. Seria mais fácil soltar letras em danças anarquistas, que não passariam de corpos autónomos, perdidos num concretismo de esperados significados. As costas daqueles que esperam por um objectivo palpável, arquearão com o peso da alienação factual.

É tentador soltar em corridas desnorteadas, não letras, mas palavras. Mas o desejo de dar frases a ler é mais forte ainda e, o tornar inteligível o que se produz, é como o desejo do louva-a-deus pela sua fêmea.

Dizer sem dizer nada, tudo dizendo, é brutal e asfixiante. Quero lá saber disto tudo, eu vou é com Morfeu.

sábado, outubro 11, 2008

duas e meia da manhã

Duas e meia da manhã, chego a casa, debruço-me sobre a máquina e começo a teclar.

Não sei sobre o que escrevo, mas um dia disseram-me que eu não tinha dificuldades em escrever, o que nem é mentira. O desejo de estar longe da máquina é nenhum e o sentir os dedos deslizar sobre o teclado satisfaz qualquer um. Lembro-me de algo, mas não consigo largar as teclas que se me aderem aos dedos como velcro.

A memória de algo fugidio é uma benesse para quem quer e todos em mim não queremos. Que quererá isto dizer? Não sabemos, mas continuamos nesta incompreensão de vómito contínuo de palavras. Cansam-se as teclas, mas não os dedos e o cérebro produz ainda mais incoerências, mesmo que… não sei.

Saltam palavras pelos olhos, impossibilitadas que estão de treparem aos ouvidos famintos de confissões honestas. Já não existem atalhos para solucionar o futuro e todos afundamos nas ilusões de um mundo melhor.

Passaram quatro minutos e eu não consigo parar. É um vício, escrever. Não sei o quê, para quê, nem porquê, mas adoro ver o texto crescer. É como se estivesse a pintar. Afasto-me, recuo, avanço e volto a pincelar. Termino.

quinta-feira, outubro 02, 2008

"em busca do tempo perdido"

quem somos nós?

Supostamente, fomos criados por aquele que foi realmente criado pela sua suposta criação.